domingo, 9 de fevereiro de 2014

JUSTIÇA E PROFECIA A SERVIÇO DA VIDA!

JUSTIÇA E PROFECIA A SERVIÇO DA VIDA!



            O que posso dizer destes dias em que vivi na Diocese do Crato, em Juazeiro do Norte, no Cariri, do Ceará de Padre Cícero, no Ceará de Patativa do Assaré, no Ceará do 13º. Intereclesial das Comunidades Eclesiais de Base?
            Próximo ao mistério de Deus no meio de tantos romeiros, tantas romeiras, prefiro me calar e lembrar na mente e em meu coração, momentos que nunca se apagarão...que estão cravados para sempre.
            Tive a imensa alegria de ser adotado pelo povo guerreiro do Norte I: Amazonas e Roraima, que me abraçaram, que me beijaram, como se eu já estivesse com eles a muito tempo e que nosso encontro fosse um reencontro...neste momento as lágrimas rolam por saudade e por amor a todos, todas que daqui para frente estarão em minhas orações e lembranças...e são muitas...muitos risos também...quero reencontrá-los, reencontrá-las em breve.
            Fui acolhido por uma família especial do Cariri, do Crato/CE, a Família Lobo: me deixaram a vontade com meu novo irmão, eu tenho um irmão indígena...(risos)...o querido Delmir, que deve chegar em breve em Belém do Pará...é um choro de alegria o de agora e de muita saudade...saudade das minhas novas irmãs, do meu novo irmão, de painho e mainha.
            No dia 07 de janeiro, após o credenciamento me dirigi para Assaré, a cidade do poeta profeta Patativa. Que alegria estar ali naquele pequeno lugarejo de onde brotou um verdadeiro ser humano. Eu agora sei que minha pesquisa em torno dele será ainda mais difícil, pois parafraseando Luiz Gonzaga a respeito de Jackson do Pandeiro: “Quando a gente encontra alguém que é muito melhor...a única coisa a se fazer é ficar quieto”. Ao conversar com as meninas da Casa da Memória Patativa do Assaré, e ver nos olhos delas, o amor pela história do grande mestre do Assaré, é que senti que ainda tenho muito a fazer e a crescer enquanto ser humano, poeta e cantador.
            Voltei de lá com a sacola cheia de livros, discos e um documentário, enquanto escrevo esta memória, ouço e canto uma canção chamada SINA (Raimundo Fagner / Ricardo Bezerra / Patativa do Assaré):

Eu venho desde menino
Desde muito pequenino
Cumprindo o belo destino
Que me deu Nosso Senhor

Não nasci pra ser guerreiro
Nem infeliz estrangeiro
Eu num me entrego ao dinheiro
Só ao olhar do meu amor

Carrego nesse meus ombros
O sinal do Redentor
E tenho nessa parada
Quanto mais feliz eu sou

Eu nasci pra ser vaqueiro
Sou mais feliz brasileiro
Eu num invejo dinheiro
Nem diploma de doutor...

            A noite celebramos a abertura dos trabalhos. E abracei Reginaldo Veloso e Zé Vicente e outros artistas da caminhada.
E começou no dia 08, de fato, o Intereclesial, com uma linda celebração e tantas vozes e chapéus, que eu disse baixinho: “Obrigado Jesus por revelar seu amor aos pequeninos”...e o Caldeirão esquentou ainda mais quando Francisco, bispo fraterno de Roma nos mandou sua mensagem de amor, afago e carinho...quando um irmão indígena nos lembrou que podem nos tirar tudo, mas nunca irão matar nossas raízes...e assim...a paz!
            Depois de dez anos, abracei meu querido irmão e amigo Vilsom Basso, scj, hoje bispo de Caxias – MA...e assim...a paz!
E reencontrei a família do querido amigo e irmão Zé Martins num vagão...ops...num rancho em sua homenagem...ao abraçar a Angela e as filhas do Zé...a emoção foi grande demais...e assim...a paz!
            Todos os dias as famílias, apesar do calor e do cansaço, nos recebiam com sorrisos, beijos e abraços e isso nos dava ainda mais força.
            No dia 09 saímos em missão, visitando paróquias e conhecendo um povo lindo...ouvimos histórias, recitação de cordel, deixamos chapéus e levamos no peito a certeza que Deus está muito mais perto dos pobres do que imaginamos. E vimos neles os profetas e profetisas que ainda não somos...mas estamos a caminho...e assim...a paz!
            No mesmo dia, subimos ao Horto de nosso Padim Padi Ciço...fomos pedir sua benção, fomos rezar os mártires de nossa caminhada: todos, todas. Foi lida a Carta fraternal que será enviada ao querido Papa Francisco.
            No dia 10 retornamos aos ranchos, depois de ouvirmos um animado Luis Mosconi, fiel romeiro e articulador das santas missões populares e o querido Frei Carlos Mesters, que no alto de sua simplicidade nos ensinou como trabalhar com o povo a partir dele próprio e da Palavra de Deus. A noite cantamos com Zé Vicente e os artistas da caminhada.
            No dia 11 escolhemos o Paraná como estado que acolherá o próximo Intereclesial das Cebs, o 14º., na cidade de Londrina.
            Depois partimos em romaria para o que seria a caminhada jubilar em homenagem ao centenário da Diocese do Crato. Depois aconteceu a Missa de Envio e com a lua surgindo, nos abraçamos uma vez mais, numa irmandade linda, desejosos de nos reencontrar nessas estradas todas da vida e manter sempre viva a profecia, defendendo a vida, lutando por justiça.
            Que Deus nos abençoe.
            Que Deus vos abençoe.
            Amém. Axé. Awerê. Aleluia.


Emerson Sbardelotti
12 de dezembro de 2014
23:45

Vitória do Espírito Santo

EU VENHO DE LONGE



EU VENHO DE LONGE

Eu venho de longe, eu venho de lá
De uma época que não é a de agora
De uma vida sofrida e tão comprida
Que só o canto é o que consola
Desde os meus tempos de menino
Vejo a vida ser exterminada
Meus olhos cheios de lágrimas
E o corpo sem força para nada

Mas eu tenho a minha poesia
E com ela eu insisto em falar
Verdades inquietas que incomodam
Para que a sociedade possa mudar

Eu venho de lá, eu venho de longe
Trago nas mãos o peso dos dias
De uma época que não é a de agora
Semeando amor e fechando feridas
Desde os meus tempos de menino
Vejo minha gente ser maltratada
Fecho os meus olhos e a alma viaja
Minhas mãos cansadas e calejadas

Mas eu tenho a minha poesia
E com ela eu insisto em falar
Verdades inquietas que incomodam
Para que a sociedade possa mudar

Emerson Sbardelotti
09 de fevereiro de 2014
16:06
*direitos reservados*

O PENSAMENTO EURÍSTICO DE JOÃO BATISTA LIBÂNIO

O PENSAMENTO EURÍSTICO!
Emerson Sbardelotti Tavares[1]



"O que é o pensamento eurístico? É aquele pensamento que depois de ler alguém, conhecer alguém, eu começo a pensar!" João Batista Libanio

            Conheci o padre João Batista Libanio, no ano de 1985, Ano Internacional da Juventude. Ele havia sido um dos conferencistas naquele final de semana e nos falava sobre o Mundo dos Jovens (título dado a um de seus livros sobre e para a Juventude), as expectativas que se abriam no limiar da história da juventude brasileira. Com imensa humildade, amor e humor, o padre Libanio se aproximava de nós como verdadeiro assessor, pois suas inquietações nos levavam a pensar sobre o que estávamos vivendo na realidade de então. Ele nos fazia perguntas fáceis, mas que necessitavam de demoradas respostas, respostas ruminadas, respostas que fizessem o grupo crescer.
            Ele em todos os seus livros, didaticamente, sempre fez questionamentos que iam, vão, no mais íntimo de nosso ser. Mesmo sendo um Doutor em Teologia, não abria mão de estar no meio dos pobres, do Povo Santo de Deus, apesar de toda erudição que tinha, conseguia conversar de forma simples, delicada, para cada público um discurso, sempre coerente e vivo.  Aprendi com ele e tento a cada dia viver: um bom teólogo não pode estar nunca somente na academia, ele tem que estar onde o povo está, caso contrário de nada valerá a teologia que recebeu e que faz!
            Eu não conhecia os escritos do padre Libanio, mas conhecia os de seus amigos queridos: Leonardo Boff e Carlos Mesters. Através dos livros destes dois, e também depois daquela conferência, comecei a comprar seus livros, e assisti-lo em VHS que uma editora católica produzia, vídeos sobre Espiritualidade, Teologia, Jesus de Nazaré. Ele falava sobre todos os campos da teologia com imensa facilidade, convicção e clareza. Foi a partir do estudo de sua obra que comecei a entender melhor o que era a Teologia da Libertação.
            Autor de 125 livros, sem contar artigos, não se recusava a escrever de próprio punho, cartas respondendo perguntas ou me concedendo uma entrevista. Em todos os nossos encontros, e não foram poucos, sempre trazia o recente livro, autografado, e eu lhe dizia que um dia escreveria e também o presentearia. “Estarei esperando...” sempre dizia e sorria.
            Em 2012, nos agradecimentos da monografia Ecoteologia: dos gritos dos pobres ao grito da Terra na perspectiva da Teologia da Libertação em Leonardo Boff, que apresentei, assim está escrito:
Aos teólogos e teólogas da libertação, pela coragem e pelo testemunho de fé e vida frente às perseguições e martírios. A Leonardo Boff, João Batista Libanio, Marcelo Barros, Carlos Mesters e D. Pedro Casaldáliga, que mantêm viva a fé e a fiel esperança”. Lhe enviei um arquivo para seu email com a mesma, e ele respondeu: “Obrigado. Siga em frente!”. Neste ano tive o prazer de reencontrá-lo, o que seria a nossa última vez juntos, no Congresso Continental de Teologia, ocorrido na Unisinos – RS. Neste Congresso, eu lhe entreguei meus dois primeiros livros: O Mistério e o Sopro – roteiros para acampamentos juvenis e reuniões de grupos de jovens. Brasília: CPP, 2005 e Utopia Poética. São Leopoldo: CEBI, 2007. O que ele com um imenso sorriso me disse: “Até que enfim...parabéns...siga em frente!” Na ocasião lhe perguntei se em meu terceiro livro (que ainda não está concluído) ele faria a apresentação? “Seria um prazer. Afinal, temos que dar apoio aos novos teólogos da libertação!”. Como era bondoso o professor Libanio...me chamar de novo teólogo da libertação. Ao escrever me emociono lembrando destas palavras, e peço a Deus, que essa profecia se cumpra. Infelizmente no último dia 30 de janeiro de 2014, o Moreno de Nazaré o chamou para junto dele. Fico com a lembrança do professor bondoso, inteligente, bem humorado e cheio de amor pela teologia e pelo povo.
Da minha parte irei me dedicar com afinco ao Mestrado em Teologia Sistemática. Ele me enviou um email dizendo: “Parabéns por mais esta conquista, não se esqueça nunca do povo.
Em nossa última conversa, dias antes de começar a Ampliada Nacional da Pastoral da Juventude, falávamos sobre a juventude, sobre o processo da educação da fé e ele sempre me pedia, me dizia isso: "que tenha coragem de lutar por uma pastoral livre, corajosa e libertadora"!
Obrigado professor querido por tudo o que semeou entre nós. A Teologia e a Teologia da Libertação perde um de seus maiores mantenedores do diálogo e do respeito, a Igreja perde um de seus maiores pensadores contemporâneos.
E eu sigo por aqui, nas suas pegadas, com amor, humor e humildade.
Até o nosso próximo encontro Libanio.


ENTREVISTA COM JOÃO BATISTA LIBANIO

EM ABRIL DE 2002

João Batista Libanio, padre jesuíta, teólogo, educador e escritor, Belo Horizonte/MG

Esta entrevista foi concedida ao Jornal ESPERANÇA JOVEM, da Pastoral da Juventude, da Paróquia Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Cobilândia, Vila Velha-ES.

Entrevistado por Emerson Sbardelotti Tavares

EMERSON – O que é a Teologia da Libertação? É a única teologia da América Latina? É a melhor?

LIBANIO: A Teologia da Libertação é, antes de tudo, uma libertação da Teologia. Ela quer ser uma teologia para a nossa situação e não simples xerox da teologia de outros países. Ao querer ser uma teologia para a América Latina, ela parte dos problemas da América Latina. Ora o maior problema que nós vivemos é a situação de opressão, de exploração das grandes massas populares. E a única maneira de superar uma situação de dominação é lutar pela libertação. Queremos, como cristãos, embarcar nessa luta pela libertação dos pobres, motivados e iluminados pela nossa fé.

A TdL é a teologia que motiva e ilumina o cristão na luta pela libertação. Por isso se chama Teologia da Libertação. Ela não organiza, nem faz a libertação. Isso fazem os homens e mulheres que estão lutando. Ela quer simplesmente ajudar esses homens e mulheres, que são cristãos, a verem o que a sua fé diz sobre tal luta, motivando-a, iluminando-a, criticando-a nos pontos em que possa ter entrado algo de anti-cristão. O papel da TdL é muito importante para sustentar a fé do cristão comprometido. Pois vimos com tristeza no passado muitos cristãos que, ao engajarem-se na luta, perderam a oposição entre fé e política, entre fé e luta libertadora, entre fé e compromisso social. Mostrar isso é uma das maiores tarefas da TdL.

Ela não é a única teologia da América Latina, mas aquela que nasceu aqui e se orienta para a nossa situação. Não se trata de comparar mas de ver sua relevância e pertinência para nossa situação latino-americana.


EMERSON – As CEBs são ainda um fenômeno ou não representam mais um novo jeito de ser Igreja?

LIBANIO: As CEBs são ainda verdadeiro jeito de ser Igreja. Mas há vários tipos de CEBs. Há aquelas que amadureceram. Há outras que fraquejaram e outras que desapareceram.
As CEBs têm manifestado uma capacidade criativa no campo da liturgia precisamente lá onde o ministro ordenado não chega regularmente. Elas continuam revelando um compromisso libertador, firme e decidido, sem talvez a aura militante de outras décadas, mas não menos sério e eficiente. Enfim, aí esta a vida das CEBs em sua beleza simples e corajosa.

EMERSON – Num mundo globalizado e globalizante, qual é o cenário de Igreja que sobressai atualmente na América Latina e Brasil?

LIBANIO: Predomina ainda na Igreja Católica, o cenário da Instituição. A preocupação interna com sua estrutura ainda é muito acentuada. No entanto, há sinais de um forte sopro carismático que vivifica toda a Igreja e flexibiliza suas instituições. Há crescente apreço à Palavra de Deus, às liturgias da Palavra, ao estudo da fé. E também ainda permanece animador em muitos setores da Igreja um entusiasmo no compromisso com o processo libertador dos pobres.

EMERSON – O que deve representar o estudo da teologia para a PJB? E o que a PJB deve representar para a teologia?

LIBANIO: Muito. A teologia é a busca de intelecção de fé. Na idade jovem se é mais exigente quanto as razões para crer. Deixa-se de ser criança que freqüenta a religião pelas mãos dos pais. Agora o jovem anda com suas pernas. Em termos de fé, significa aprofundá-la. E para fazê- lo, nada melhor que a teologia. E, por sua vez, a teologia também deve levar em consideração as perguntas que os/as jovens lhe levantam. Eles/as são como a febre do organismo da sociedade. Revelam a existência da infecção sem talvez apontar para qual ela seja exatamente. E a teologia percebendo tal aviso e alarme mergulha no problema e aprofunda.

EMERSON – Qual a mensagem que o sr. daria para os nossos grupos de base da PJB?

LIBANIO: Num mundo de desesperança e desânimo, ser um sinal de coragem e engajamento. Num mundo que só valoriza o presente, acreditar no futuro, forjando utopias. Num mundo hedonista, mostrar que o verdadeiro prazer está na entrega de si aos outros. Num mundo de corrupção política, exercer vigilante controle sobre a administração pública para evitar a malversação dos bens públicos. Num mundo de violência, revelar a liberdade e transparência acolhedora da tolerância e do amor. Enfim, anunciar em palavras e ações que é possível criar uma sociedade alternativa a esta que aí está, começando já no seu meio juvenil o ensaio do mundo futuro de fraternidade, igualdade, acolhida, paz e amor.

EMERSON – Pe. Libanio, nas comemorações de 75 anos de tua existência só temos agradecer a sua valiosa contribuição para o crescimento de nossos jovens, de nossas jovens na caminhada de PJB. Muito obrigado!



[1] Mestrando em Teologia Sistemática pela PUC-SP (Campus Ipiranga); Bacharel em Teologia pelo Instituto de Filosofia e Teologia da Arquidiocese de Vitória do Espírito Santo; Licenciado em História pelo Centro Universitário São Camilo/ES (Campus Vitória); Bacharel em Turismo pela Faculdade de Turismo de Guarapari/ES; Autor de O Mistério e o Sopro – roteiros para acampamentos juvenis e reuniões de grupos de jovens. Brasília: CPP, 2005 (www.cpp.com.br); Autor de Utopia Poética. São Leopoldo: CEBI, 2007 (www.cebi.org.br). Assessor para as áreas de Mística e Espiritualidade, Juventude, Bíblia e Liturgia. Correio eletrônico: prof.poeta.emerson@gmail.com.